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Mostrando postagens com o rótulo Reflexão

Quarentena. Dia 15.

Quarentena. Dia 15. Algumas pessoas desesperadas com o tédio. Possível. Tédio? {fastio  Dia 12 foi a última vez que pus a cara na rua para coisa outra que não comprar comida. Depois? Mercado. Lavar roupa na casa do amigo. Isolamento real. Dias sem sol. Dias de muitos agitos. Dias de muitas demandas. Pressão. Tensão. Alguns dias em que a solidão que gosto, incomodou - porque mais que estar só, em silêncio, havia muitos gritos na minha mente. Problemas. Angústias. Preocupações. E todas as assombrações da política do nosso país. Os picos de emoção ainda são basicamente conectados às coisas que a gente queria resolver e não pode. NÃO PODE MESMO. E se ver o que sempre foi - um ser pequeno que pode pouco, embora se ache muito, é frustrante. Não deveria frustrar, já que o tempo todo a gente lida com coisas, próprias ou de outras pessoas, acerca das quais pouco ou nada se pode fazer. Mas a gente frustra. O outro pico de emoção é com a mãe teimosa, que não

Um abraço é uma entrega

Sempre fui uma pessoa muito severa, com o outro, mas profundamente comigo. Não admitia erros. Que tola! Em 2001 fui alçada a uma posição no trabalho, pelo qual respondia com relativa competência. Poucos meses, já 2002, e a chefia mudou. Sob uma crise financeira bem grande e no novo perfil de gestão eu não correspondia ao que se desejava e precisava de mim. Fui tirada da função de um modo muito triste. E foi o modo mesmo. Eu realmente não estava preparada. O baque na estima, que nunca foi lá essas coisas, foi bem pesado e sofri muito. Eu chorei copiosamente porque não admitia o fracasso de não ter correspondido à confiança depositada. Àquela altura eu estava fazendo um curso na área de gestão e administração. Coisas básicas. Uma das aulas foi sobre ABRAÇAR. Pense. ABRAÇAR. Era estranho. Imagina. Eu não conhecia aquelas pessoas, a não ser das aulas. A orientadora disse, lembro com uma clareza absurda: Ádila, você precisa sentir o coração da

A vida é invenção

A vida é invenção, como a refeição que a gente se dá a inventar. O meu processo é muitas vezes assim. O que tenho? Vejo. Observo. Penso um pouco. Às vezes pesquiso. Então, faço a minha receita. Às vezes sai melhor que encomenda. Outras vezes atende à necessidade primordial. Noutras, todavia, é mera decepção. E a gente se reinventa para outra invenção. A grande delícia para que o existir não se faça sempre insosso, talvez resida nisso: aventurar-se a pequenas experimentações. Daquelas que não nos agridem. Aí a gente descobre sabores e suas combinações. A gente vive a saciedade e o alimentar da alma, o renovar do ânimo. E então, a gente vai aos poucos descobrindo a vida e sabendo-a bonita. O que você tem hoje para fazer uma experiência de bem viver? Que sabores a combinar? Que arranjos possíveis? Só não deixe vencer e estragar, os ingredientes. Eles têm prazo de validade. Sempre tem. E as letrinhas são bem pequenas. Quase nunca conseguimos discerni-las. #pensandoalto #pensand

CICLO DOS COMUNS. ABRIGO.

Às vezes nossos corações são tão multidões de medos, inconstâncias e certezas, que sufocamos em nós mesmos todos os espaços ao acolhimento à escuta, à afeição, às histórias dos nossos convivas, ao riso despretensioso, ao toque, ao olhar, ao abraço - matérias da atenção, da consideração, do coração que outro coração hospeda, fazendo-se a ele lar que recebe outra existência, de modo a colaborar para que ela se faça vida. Nas nossas próprias multidõe s  nos amesquinhamos e deixamos de ser abrigo, fazendo-nos apenas deserto. Meus últimos anos tem sido um rico ciclo de acolhimento. Tenho-me percebido abraçada por pessoas - gente diversa de mim e ao mesmo tempo tão profundamente em conexão comigo, porque nossas almas anseiam espaços muito semelhantes para os valores do comum e da unidade na diversidade, do respeito e do afeto. Tenho-me transformado e isso é divino. Acredito que esses ciclos me tem feito uma pessoa melhor. Isso é divino. É divino quando nos transformamos,

Potente é olhar pelos pequenos

A nossa era é, possivelmente, a mais contaminada pela síndrome da grandiosidade. Os  grandes números cantam as regras e encantam as mentes ,num moinho de eventos impressionante e que esmagam quase todas as possibilidade de construção que não se inspirem em ser monumental no seu espectro de partida. O Evangelho segundo Lucas traz uma história cheia de simbolismo. Conta de certa ocasião em que estando o Jesus em determinada cidade, Zaqueu, cobrador de impostos, querendo vê-lo e não podendo por causa da multidão que o cercava, posto que era homem de pequena estatura, subiu numa árvore para avistá-lo. Que grande líder ficaria à procura de pessoas pequenas? Jesus. Sim. Ele foi aquele tipo de líder que não descartava as pessoas em decorrência de suas fraquezas e debilidades. Ao contrário, no encontro com os pequenos e fracos Ele colocava todas as suas energias para que as pessoas assim qualificadas - por suas próprias mentes, por seus pares ou pelas condições de sua existê

Escuta. Alegrias e Dores. Direitos Humanos no cotidiano.

Quando a gente separa um tempo para escutar as pessoas o tempo seguinte pode ser o abraço da despedida ou do acolhimento às alegrias e dores compartilhadas. Tenho feito o exercício intensional do acolhimento porque quero minhas palavras e ações cada vez mais próximas, de mãos dadas. Muitas foram as dores que compartilhei nas últimas semanas. Muitas foram as dores que acolhi e, parte significativa delas se conectou ao meu senso de justiça, me deixando  triste, provocando revoltas, estimulando reflexões às quais estou procurando amparo, luz e compreensão sobre o que vem a significar. Estou lendo mais uma vez, 'A construção do público: cidadania, democracia e participação', de Bernardo Toro. Revistar essas páginas me ajuda muito nesses momentos de pensar coisas que me são muito caras. A cada nova leitura um acúmulo da experiência anterior e o que, no curso do cotidiano experiencio. A percepção inicial - da qual outras se desdobram - é a cobrança da existência no que tocamos e no

Ordem autoritária não sustenta respeito

Quando a força bruta é a premissa semeada no espaço pedagógico, sua lição não tarda germinar e em se reproduzir. Ainda nos faltará muito para compreender que o simbolismo comunica com muita eficiência? A escola é o espaço da irmandade, da colaboração, da coletividade para o aprendizado saudável e de melhoramento das pessoas. Uma comunidade humana que tem problemas e fissuras relacionais como qualquer outra. Justamente por seu caráter pedagógico em tudo - estrutura física, sistema organizacional, operação de rotinas, conexões entre seus entes -, é a escola um campo fértil às práticas nela semeadas , especialmente sob a chama simbólica, que nunca demoram a germinar e a se reproduzir. O respeito semeado pela cultura da paz e do reconhecimento de valor à diversidade e da resolução de conflitos através do diálogo floresce em espaços, ambientes e em pessoas movidas a se desafiarem a novas posturas quando feridas na alma, confrontadas em seus erros, desabonadas em suas opiniões

Sobre dores

Desde muito jovem atuo em frentes de assistência social. Já lidei com mil dores. Minhas e de outras pessoas. Nunca, porém, desenvolvi ações ou ajudei em hospitais. É uma realidade muito distante das minhas capacidades. É como me vejo. Não sei o que fazer ou dizer, em hospitais. Isso é profundamente, estranho. Já são sete dias de internação da minha mãe. Ela está bem. Apesar de todos os desconfortos naturais desse processo e suas condições. Está recebendo atenção médica qualif icada, sendo acompanhada e aguardando cirurgia - que foi adiada para quinta-feira (14). Hoje a noite começou agitada. No quarto ao lado, um senhor que não para de vomitar. Parece que suas tripas vão sair pela boca, tamanho esforço que faz e desespero que exprime no gemido. Noutro canto um paciente está tão agitado que a equipe foi acionada para contê-lo. Em outro quarto, um outro paciente chora desesperadamente. Um choro de profunda dor. Nada posso fazer. É um estado de impotência estranho, desconcertante.

Minha mãe passou mal

Na segunda-feira minha mãe passou mal. Vômitos. Uma vez no hospital, já foi internada, pois o que tinha, na verdade, era um ataque cardíaco. Foi submetida a um cateterismo. Tentativa de angioplastia, sem sucesso. E aguarda, agora, uma ponte de safena para resolver o drástico quadro de entupimento de veias. Desde segunda-feira temos nos revezado no acompanhamento na UTI. Meu plantão é das 20h às 8h, em dias alternados, e em claro, claro, porque seria impossível pregar o olho c om os equipamentos buzinando e o entra e sai de profissionais para fazer medições de rotina e medicações necessárias. Fico aqui, entre um filme, uma leitura e mil pensamentos, tentando acelerar o tempo e, ousando avaliar a fragilidade da nossa existência e como ela se oculta na nossa arrogância da certeza de eternidade, da superiodade e autoridade sobre a vida, quando isso não existe. Nunca existiu. Hoje estamos e em seguida não mais. Em um instante, tão donos de nós e de todos, no instante depois, com

A vida se dá compartilhada

John Donne, já há alguns séculos bradava que "nenhum homem é uma ilha, isolado em si mesmo; todos são parte do continente, uma parte de um todo." Mas nós, ao contrário da óbvia primeira interpretação possível, nos conduzimos à insistente apropriação do comum como se a um pertencesse. Nosso olhar é detido em nós, em atroz perturbação individual que perfura qualquer outro olhar mais cordial ao outro - parte de nós em significado existencial mais elementar. Compartilhar, o verbo (ação) que deveria ser o eterno presente da nossa existência, tal qual respirar, dissolve-se invisível, sem qualquer questionamento, como quando nos falta ar ou o que se tem é poluído, pesado. Esquecemos com muita facilita que somos comum desde antes de existirmos. Somos a soma de dois, conjunto de vários e, conforme se fazem os dias em nosso existir, nos tornamos milhares. Um pouco de cada um antes de nós. Um pouco dos convivas. O profundo mistério da coexistência. E por que insistimos em

SOBRE SILÊNCIOS

Não faz muito tempo fiquei realmente impressionada ao me dar conta de que tinha ficado quase 72 horas sem dar uma única palavra com ninguém. Nem aquele áudio insuportável via Whatsapp. Sou um paradoxo nessas coisas porque sou tagarela em assuntos do meu interesse, capaz de conversar sobre um leque de assuntos até interessantes, sem passar vergonha. Também sou uma boa oradora. Brinco que se tiver um pouquinho de conhecimento do assunto enrolo bem e, em alguns  temas até me passo por sabichona. Sou mega ativa em algumas plataformas digitais. Todavia, adoro o silêncio e casa vazia por causa dele, o silêncio. Gosto de observar pessoas. Gosto de me dedicar às pessoas. Mas não abro mão do silêncio. Há pouquíssimas pessoas com as quais eu me percebo quase espontaneamente conversadeira. Menos ainda aquelas ao lado das quais o silêncio não incomoda a mim, nem a elas. Isso diz sobre mim e sobre o mundo. E ainda não tenho clareza do que exatamente. Claro está, para mim, da necessidade q

Depreciação e Supervalorização da Pessoa Humana.

Depreciação e Supervalorização da Pessoa Humana. É bem possível que ambos façam mal na mesma medida. Crescemos não recebendo valorização de capacidades, na adolescência e juventude a semente brota em incapacidade de se perceber e adultos, nos depreciamos sem que ninguém mais precise fazer isso. Alguns, após alguma convivência conosco, nos repetem incontáveis vezes sobre os nossos talentos, as nossas capacidades extraordinárias. Mas é quase tarde. É uma luz que brilha para for a. Aqui dentro a gente continua não sabendo como lidar com elogio e, pior, em como tornar em algum justo e lícito benefício para nós mesmos, todas essas capacidades e talentos por outros, repetidas vezes, percebidas. Ou ao menos parte. Em paralelo, quase sempre, esses casos são acompanhados pelo espírito de escada suja. Quando há sempre alguém beneficiado pelo que somos capazes de fazer, todavia, a escada jamais é louvada quando se chega ao objetivo do esforço, tão somente as pernas que a escalaram. E o

Em meus passos, o que faria Jesus?

Tomando por inspiração um best-seller da literatura evangélica,  ‘Em Seus passos - o que Jesus faria?’, tenho feito o meu esforço para tentar compreender o que está se passando conosco, como diz o irmão Daciolo, Nação brasileira. Um país de maioria esmagadora cristã, que escolhe o caminho da violência para resolução de conflitos, em absoluto e claro desacordo ao que apregoa o Evangelho do Cristo. Se isso é terrível, torna-se execrável fazê-lo em nome de Deus e seus valores. Acho que nos desviamos do Caminho. Obviamente, o desvio da rota do Cristo, que hoje assume contornos grandiosos, em todas as expressões da nossa sociedade e culmina na virulência e medo como norte à tomada de decisões, não começou em 2016. No final dos anos 80 começou ganhar notoriedade uma nova configuração de igreja evangélica no Brasil. Novos ritmos, novo tipo de acolhimento, novas formas de expressão, mais liberdade comportamental, ritos menos pesados na liturgia. A igreja evangélica ganhou as ruas com mais

Só quero mais uma vez esperançar

Gosto muito do meu nome. Não tenho a menor ideia sobre como meus pais o definiram. Pelo sei, nem eles sabem. Nessas pesquisas cinfrinhas da web, sobre a origem do nome, ele aparece associado a Adélia, significando, segundo dizem, "PESSOA DE NOBRE ESTIRPE". Não é pouca coisa! Mas, se fôssemos nós os responsáveis por nós dar nome, talvez me chamasse ESPERANÇA que para mim é um registro sobrenatural de resiliência e é esse o melhor retrato que tenho de mim mesma. Em todos os traumas e privilégios que a existência me tem dado viver louvo a esperança de acreditar quase sempre, de levantar uma vez e outra mais e mais outra, de verdejar e amarelar e a folha cair e recomeçar e esperançar. A esperança é um mistério poderoso. Nesses tempos de trevas,  rancores,  ódios, incompreensões, desespero, ansiedade, violências, desprezo ao diálogo, medos, sinismo  eu faço uma oração ao Eterno que creio o dom da vida: não me deixe perder o viço da esperança, sua força, seu brilho, sua sereni

Ai de vós, líderes religiosos. Impostores.

Quando eu exercia, como a gente diz na igreja, o ministério pastoral, das coisas que mais me davam frio na espinha e arrepio, era pregar - a hora dos sermões. Minha vontade às vezes era de correr. Não por medo de falar em público. Não. Tenho muito problema para assumir as coisas que faço bem, mas em uma já estou certa de que sou boa: se eu tiver mínimo domínio sobre determinado assunto, eu falo bem; outras vezes enrolo bem; outras vezes me viro bem. Ou, como me disse a Professora Inês, em 1992, quando eu fiz um discurso numa festa da escola, eu tenho o dom da oratória. Eu era apenas uma adolescente. Ou, eu nasci assim! Mas, na igreja me apavorava cada culto em que a responsabilidade da palavra era minha. E foram muitas vezes ao longo de 13 anos. O motivo? Eu sempre soube do poder do que eu falava. Tive um pastor, Douglas (que ainda mora no meu coração rs) que insistia nas suas pregações, que investigássemos o que ele falava à luz do Evangelho e da pessoa do Cristo. Aprendi qu

Pelo direito de sonhar

Era quarta-feira, como outras tantas na padaria perto de casa. Um pigado, por favor. Com mais café e leite, bem quente. Mais quatro biscoitos de queijo. Meu pedido de todo dia. Enquanto espero...uma mensagem salta no Messenger. "Ádila, sabe de alguma oportunidade de emprego?" Não é a primeira vez a mesma questão me bate à porta. Minha caneta cor de rosa também salta para escorrer sua tinta no primeiro verso de papel que encontro na mochila. Impossível não me ver voltando ao final da década 1990, quando eu tinha a mesma idade do meu amigo da conversa. Muito embora, é preciso afirmar, mesmo em condições severas, as dele são bem mais arrojadas. 1997. Eu morava em Ceilândia. QNM 03. Quem conhece sabe que é barra pesada. Hoje ainda menos que naquela década. Mais de uma vez, ao retornar da escola (CEd 07) me deparava com a rua (conjunto G) fechada pela PATAMO. Ninguém entrava ou saía até que mais uma operação atrás de merla,  a droga da quebrada, fosse finalizada. Uma vez te

Abraços, poderosos entrelaçamentos

Abraços são tão poderosos e fazem tanta falta, muitas vezes! Todos já passamos pela por aquele dia em que não queríamos palavras, presentes, nada. Apenas um abraço e rosto e ânimo se transformavam. Abraço, aquele nomento especial, quando dois corpos se encontram e se entrelaçam, trocam energia, cheiro, calor e se fazem vivos em toque tão profundo que é capaz de fazer aflorar o melhor de nós. A verdade é que todos deveríamos nos permitir abraçar, de verdade, com firmeza, em cada encontro com aqueles que amamos, aqueles que tem significado para nós, aqueles que de algum modo estão na nossa vida. Abraços aquecem, curam, encorajam, acolhem, falam com tanta clareza que nos deixam sem palavras. Não à toa cantamos que "o melhor lugar do mundo é dentro de um abraço". Em tempos de apartação pelos motivos mais tolos possíveis, bom seria fôssemos capazes de nos permitir mergulhar num abraço amigo ou do filho, mãe, pai, do amor, de quem ocupa a nossa mente com ternura. Você é capa

Deixar as malhadas

R ecentemente uma amiga me admoestou com a seguinte frase: "mana, já está de você deixar as malhadas". Claro que eu ri, e muito. A referência é bíblica, à história de Jacó e seus tempos de serviço ao sogro  Labão, enriquecendo-o e não tendo adequado reconhecimento por seu trabalho. É  principalmente, uma chamada à aceitação pública de desafios que muitas vezes a gente já enfrenta no privado, "às escondidas", nos bastidores. Nunca enriqueci ninguém e, graças a Deus,  meu trabalho quase sempre teve reconhecimento de valor. Não em todos os sentidos, obviamente. Há um fato importante porém, trazido por essas referências e de modo muito forte. Mostrar o que sou capaz de fazer, ou melhor, assumir minhas capacidades, nunca foi algo que me atraísse. Muito ao contrário. Quase sempre só me salta aos olhos a ácida crítica que eu mesma me imponho. Sei fazer muitas coisas e quando assumo desafios normalmente tenho excelente desempenho. Mas tenho enorme e sincera dificuldade

Sob cargas, destinos

Dezesseis, não mais que dezoito anos, dou como sua idade. No generoso fio que escorria no seu rosto, bem mais que suor, escorria sua juventude, energia, esperança, sonhos, outro futuro possível.  O olhar? Embaçado da fumaça dos carros apressados que reclamavam sua presença m suas vias. Atrás de si e carregado pela força dos juvenis braços, um carro de dois pneus e uma pesada carga do nosso consumo exagerado, nosso desperdício de vidas. Uma buzina. Um grito. Uma passagem de raspão. O quase atropelo de um corpo de dezesseis anos que via tudo passar rápido, a começar da sua juventude. No carro, outro possante? Sim, mas não o motor de muitos cavalos. Um outro ser de impávida juventude, força, sonhos, usufruto bem nutrido do presente, futuro garantido - senão pelo não sabido que não se controla, Era negro, aquele outro de animal, a carregar cargas que não produziu. Pele preta, daquele quase atropelado no asfalto, uma quase repetição do atropelo da sua exis

SOBRE A FELICIDADE

Sempre tive certo preconceito com "pessoas felizes". Não acredito na felicidade,  assim, como se propaga e nos é vendida. Acredito no estado de felicidade, por exemplo, que nos  invade diante de uma criança sorrindo ou fazendo aquelas perguntas ou argumentações que nos tiram o chão, nos desnudam e nos colocam no lugar da insignificância - o único que nos pertence no final das contas. Acredito no estado de felicidade que se apodera do nosso olhar frente à delicadeza ou poder incomparável da natureza, em cores, formas, sabores. Ou ainda, nos acordes musicais, na poesia, nos mistérios da lua, no silêncio. O estado de felicidade nos provoca pensamentos, nos orienta, nos impulsiona a ações mais gentis, mais humanas, nos faz cambaleantes e nos inspira a buscar novo ciclo feliz. Às vezes nos paralisa também. O estado de felicidade é tão poderoso que parece se eternizar. Mas não creio real essa tal felicidade em sorrisos que não findam,  celebrações eternas, graça a perder de vis