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Em meus passos, o que faria Jesus?

Tomando por inspiração um best-seller da literatura evangélica,  ‘Em Seus passos - o que Jesus faria?’, tenho feito o meu esforço para tentar compreender o que está se passando conosco, como diz o irmão Daciolo, Nação brasileira. Um país de maioria esmagadora cristã, que escolhe o caminho da violência para resolução de conflitos, em absoluto e claro desacordo ao que apregoa o Evangelho do Cristo. Se isso é terrível, torna-se execrável fazê-lo em nome de Deus e seus valores.

Acho que nos desviamos do Caminho.

Obviamente, o desvio da rota do Cristo, que hoje assume contornos grandiosos, em todas as expressões da nossa sociedade e culmina na virulência e medo como norte à tomada de decisões, não começou em 2016.

No final dos anos 80 começou ganhar notoriedade uma nova configuração de igreja evangélica no Brasil. Novos ritmos, novo tipo de acolhimento, novas formas de expressão, mais liberdade comportamental, ritos menos pesados na liturgia.

A igreja evangélica ganhou as ruas com mais força e visibilidade, e os antes esquisitos crentes ganharam ares de modernidade, sofrendo menos hostilidade social.

Agora havia famosos de toda ordem evangélicos, empresários, jogadores de futebol, atrizes, atores...Rádios e Televisões dia e noite pregando o resgate do mais vil pegador, sua transformação e prosperidade.

Os pastores apreciaram a fama. Multidões de seguidores em reuniões gigantescas começaram a dar ao ego deles requintes de divindade, e a mensagem começou a ser adaptada para dar mais força ao milagre financeiro, a desejada prosperidade da propriedade, ao mesmo tempo em que o milagre da transformação do caráter – árdua tarefa do discipulado de uma vida intensamente mergulhada ao amor a outra vida, foi perdendo ênfase e status de necessidade elementar da caminhada com o Cristo.

Por concessões de rádios e tv’s, sob a sombra da propagação do evangelho, as mais variadas concessões foram sendo dadas, na prática da constituição de igrejas e suas células de expansão.

Milagres fabricados. Emoções manipuladas. Dinheiro. Poder.

Cada vez mais campanhas para aquisição de bens materiais foram sendo desenvolvidas. Cada vez menos campanhas para transformação da mentalidade, na perspectiva de procurar desenvolver o caráter do Cristo.

Desde pequena sempre ouvi sobre tomar cuidado para que a cultura do mundo, os conceitos do mundo, os valores do mundo, os costumes do mundo não entrassem no meu coração.

A igreja, todas, sempre pregaram contra os valores do mundo.

Mas, eis que a cultura do mundo, os conceitos do mundo, os valores do mundo, os costumes do mundo encontraram na igreja evangélica brasileira, tanto quanto em outras partes do mundo – que inclusive nos inspiram – o acalento perfeito.

Ira incontida, rancor, violências, preconceitos, materialismo, egoísmo, disputas e coisas semelhantes a estas, é isso a cultura do mundo que o Evangelho combate e contra a qual o Cristo veio, apregoando uma nova cultura cuja base essencial é o amor, de onde emana respeito, bondade, tolerância.

A escritura sagrada nos foi dada para desenvolvermos esperança de que é possível, que a nossa imagem deformada em decorrência do mal que em nós se instaurou, pode ser redimida. Ela, a escritura, registra a queda, a degeneração do homem em suas mais pérfidas escolhas e desgraças, apontando para um novo sistema de vida, inspirado na pessoa do Cristo - expresso no que ele sentia, falava e praticava em relação às crianças, às mulheres, às pessoas desprezadas da sociedade, aos doentes de toda ordem, à natureza, às instituições religiosas e políticas e ao ordem social opressora.

Ele, o Cristo, foi um contestador da cultura do mundo, dos conceitos do mundo, dos valores do mundo, dos costumes do mundo, denunciando-os e praticando uma nova cultura, novos valores, novos costumes.

Em meus passos, o que faria Jesus?

Acho que esse registro de uma de suas parábolas ilustra bem:

“Vinde, abençoados de meu Pai! Recebei como herança o Reino, o qual voz está preparado desde a fundação do mundo. Pois, tive fome e me destes de comer; tive sede, e me destes de beber; fui estrangeiro, e vós me acolhestes. Quando necessitei de roupas, vós me vestistes; estive enfermo, e vós me cuidastes; estive preso, e fostes visitar-me.

Mas, Senhor! Quando foi que te encontramos com fome e te demos de comer? Ou com sede e saciamos? E quando te recebemos como estrangeiro e te hospedamos? Ou necessitado de roupas e te vestimos? Ou ainda, quando estiveste doente ou encarcerado e fomos ver-te?

Com toda a certeza vos asseguro que, sempre que o fizeste para algum destes meus irmãos, mesmo que ao menor deles, a mim o fizestes.”

Nos meus passos, o Evangelho me diz, que o Cristo não escolheria os destinos políticos do país a partir do medo que rega o ódio (ou ódio que rega o medo).

Nos meus passos, o Evangelho me diz, que eu toda a minha liberdade de ação social e política tem limite, e sua macro orientação está no Sermão do Monte e em algumas parábolas, está na pessoa do Cristo.

E vou seguindo, minha caminhada, em esforço grande para me levantar aos tropeços diários, perguntando sempre, o que Jesus faria?

Que Deus tenha misericórdia de nós.

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