A nossa era é, possivelmente, a mais contaminada pela síndrome da grandiosidade. Os grandes números cantam as regras e encantam as mentes ,num moinho de eventos impressionante e que esmagam quase todas as possibilidade de construção que não se inspirem em ser monumental no seu espectro de partida.
O Evangelho segundo Lucas traz uma história cheia de simbolismo. Conta de certa ocasião em que estando o Jesus em determinada cidade, Zaqueu, cobrador de impostos, querendo vê-lo e não podendo por causa da multidão que o cercava, posto que era homem de pequena estatura, subiu numa árvore para avistá-lo.
Que grande líder ficaria à procura de pessoas pequenas?
Jesus.
Sim. Ele foi aquele tipo de líder que não descartava as pessoas em decorrência de suas fraquezas e debilidades. Ao contrário, no encontro com os pequenos e fracos Ele colocava todas as suas energias para que as pessoas assim qualificadas - por suas próprias mentes, por seus pares ou pelas condições de sua existência física e social, sentissem segurança para enxergar valor em suas capacidades e na potência das pequenas conexões.
Foi assim com Pedro de ânimo desterrado após negar o Cristo por três vezes e no seu momento de maior solidão e sofrimento.
Foi assim com Madalena de sonhos e liberdades violentadas sob a ameaça de morte por apedrejamento.
Foi assim com a mulher cujo fluxo de sangue contínuo (de doze anos) era colocada à margem da vida social e a humilhada espiritualmente.
Foi assim com o cego Bartimeu, desprezado à beira do caminho.
Foi assim com as crianças que eram invisibilizadas pela sociedade.
E foi assim com Zaqueu, um homem de posses de origem duvidosa.
Jesus realmente acreditava que os pequenos tem valor poderoso e que dos pequenos vem as revoluções efetivamente transformadoras. Por isso ele se dedicava às pessoas e não ao assédio das vultuosas construções religiosas do seu tempo. Por isso ele se dedicava às pessoas. O Evangelho diz que ele olhava as multidões e delas se compadecia. Era um entrega plena por aquelas pessoas que se achegavam a ele, e na multidão ele sempre encontrava uma maneira de tocar a individualidade de cada ser e nunca as tratava como massa uniforme.
Então, quando ele viu Zaqueu imediatamente dirigiu-lhe a palavra: desce da árvore depressa. Li certa e concordei, que é como se ele falasse: vem ficar em pé de igualdade comigo. Considero uma honra estar com você esta noite.
Muitas vezes nós somos atropelados pelas incontáveis demandas que nos assediam e por tantas coisas que nos cobram presença e efetividade no que fazemos e somos, que esquecemos dos pequenos que andam conosco e que são, no geral, invisibilizados pelos grandes acontecimentos, pelas grandes urgências, pelos grandes problemas, pelas grandes soluções que as nossas responsabilidades nos exigem.
Talvez o segredo para fazermos a virada de que tanto precisamos está nos pequenos. E aí, algumas perguntas precisam ser (talvez) consideradas por nós.
- Quanto de energia temos investido na valorização das nossas equipes, das pessoas que estão no front conosco - especialmente aquelas que são tidas, na era da grandiosidade, como as mais facilmente substituíveis?
- O que temos postos, do que somos e nos tornamos, à disposição dos pequenos?
- Quanto temos valorizado os pequenos começos?
Ressignifcar espaços e valores na nossa sociedade não é objeto de ação sobrenatural, mas de ação direta de cada pessoa que se percebe e assume agente de transformação, e aos líderes de toda ordem, penso, esta deve ser base de missão e existência. Ou apenas seremos reféns das grandes máquinas de poder que estraçalham existências e as pequenas revoluções do cotidiano - que dão à humanidade a condição de sublime, postas que relacionais, não encontrarão lugar de se fazerem potentes. E viveremos apenas mais do mesmo.
E se aprendêssemos que potente é olhar pelos pequenos?
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