Na segunda-feira minha mãe passou mal. Vômitos. Uma vez no hospital, já foi internada, pois o que tinha, na verdade, era um ataque cardíaco.
Foi submetida a um cateterismo. Tentativa de angioplastia, sem sucesso. E aguarda, agora, uma ponte de safena para resolver o drástico quadro de entupimento de veias.
Desde segunda-feira temos nos revezado no acompanhamento na UTI. Meu plantão é das 20h às 8h, em dias alternados, e em claro, claro, porque seria impossível pregar o olho com os equipamentos buzinando e o entra e sai de profissionais para fazer medições de rotina e medicações necessárias.
Fico aqui, entre um filme, uma leitura e mil pensamentos, tentando acelerar o tempo e, ousando avaliar a fragilidade da nossa existência e como ela se oculta na nossa arrogância da certeza de eternidade, da superiodade e autoridade sobre a vida, quando isso não existe. Nunca existiu.
Hoje estamos e em seguida não mais.
Em um instante, tão donos de nós e de todos, no instante depois, completamente entregues ao destino e na melhor das hipóteses, a dádiva dos cuidados de alguém que a existência nos presenteou ter ao lado. Porque ter alguém é um presente de grande valor.
E passamos os dias correndo contra o vento, deflagrando mil coisas para ter coisas, sem nos exercitar no elementar, as conexões humanas e o sentido da vida além do mero existir e estar aqui. O porquê deveria nos importar.
É bom não nos enganarmos também nisso. Crise existencial é apenas o primeiro degrau desse exercício. E porque dói e pesa, a nossa escolha é não fazê-lo e nos recolhermos à insignificância da arrogância de nos acharmos suficientes em nós mesmos, quando a grandiosidade da nossa existência está em sermos parte.
Nos quartos, sempre alguém sob o peso da frágil existência, em mil possíveis recortes de motivos para estar aqui, numa cama de hospital.
E o que embala os pensamentos dessas pessoas, quando ainda há consciência de pensar?
Promessas de outro jeito de existir para experimentar viver o que resta?
Medo, prisão do descontrole sobre o que é ou deixa de ser, na clara limitação da não autoridade sobre a vida?
Satisfação por atos, páginas de vida escritas com louvor no livro da existência?
Arrependimento por ter corrido atrás de ter e desconhecido os incontáveis significados de ser?
E todos esses profissionais para os quais a vida e a morte parecem apenas detalhes nem tão atraentes assim, de um filme que são forçados a assistir?
São muitas conjecturas sob o manto de preservar a existência e elevá-la ao patamar de valeu a pena estar aqui e viver, na Terra dos viventes.
Tic tac, tic tac
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