Desde muito jovem atuo em frentes de assistência social. Já lidei com mil dores. Minhas e de outras pessoas. Nunca, porém, desenvolvi ações ou ajudei em hospitais. É uma realidade muito distante das minhas capacidades. É como me vejo. Não sei o que fazer ou dizer, em hospitais. Isso é profundamente, estranho.
Já são sete dias de internação da minha mãe. Ela está bem. Apesar de todos os desconfortos naturais desse processo e suas condições. Está recebendo atenção médica qualificada, sendo acompanhada e aguardando cirurgia - que foi adiada para quinta-feira (14).
Hoje a noite começou agitada. No quarto ao lado, um senhor que não para de vomitar. Parece que suas tripas vão sair pela boca, tamanho esforço que faz e desespero que exprime no gemido. Noutro canto um paciente está tão agitado que a equipe foi acionada para contê-lo. Em outro quarto, um outro paciente chora desesperadamente. Um choro de profunda dor.
Nada posso fazer. É um estado de impotência estranho, desconcertante.
Nós não sabemos lidar com a dor. Ela nos dilacera, desequilibra, suscita desejos improváveis em estado normal, dissocia desse agora para um salto num infinito desconhecido ou sobre uma ponte invisível, de outro momento nada relacionado ao do gemido e choro da dor. Seja ela qual for. Apenas queremos que ela se vá.
Penso que é muito difícil ter controle emocional para lidar equilibradamente com dores. Sejam quais forem e, muito embora, algumas dores pareçam menos doloridas que outras, especialmente no corpo ou alma de quem não as carrega.
Que dores nos desorientam hoje? Como estamos lidando com elas? Nossos sentidos ainda acolhem os seus sinais ou já não conseguimos medi-las para orientar o socorro preventivo ou curativo?
Em que medida nos mantemos alerta às dores do próximo ou apenas a medida do julgamento nos acompanha? Este peso morto na sacola que acoplamos à nossa alma e do qual não abrimos mão!
A sentença é 'nada posso fazer' e assim, tapo os olhos para não ver e os ouvidos para não ouvir e sigo, minha noite escura na qual importa apenas a minha própria dor, presente agora ou não?
E se o alívio à dor do próximo fosse o meu próprio alívio?Sabendo disso eu me moveria, em misericórdia, na sua direção, ou a minha busca continuaria a ser a minha dor, sem disfarces?
Uma dor de cabeça pode matar. Uma dor na alma também. Uma pessoa insensível jaz morta, corpo operante sem alma, capaz de atrocidades inimagináveis.
Como temos reagido às dores transeuntes ou companheiras nos nossos caminhos, mesmo as que não nos tocam diretamente?
Fome. Vícios. Prisões. Disfunções mentais ou físicas. Desemprego. Falências. Inadequação social. Guerra. Desterro. Doenças. Separações. Incompreensões. Morte.
Que dor nos dói?
Que dor nos impulsiona à procura da cura?
Que dor nos desperta à necessidade de trabalhar por saúde - a nossa e do próximo, da sociedade, do planeta?
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