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Mostrando postagens com o rótulo Reflexão

Reforma?

Daqui 11 dias celebraremos 505 anos da reforma protestante.  Naquele 31 de outubro de 1517 dava-se início ao movimento reformista, que dentre seus legados está a separação de Estado e Igreja. É legado da reforma também o ensino sobre o sacerdócio de todos os santos, na busca por resgatar alguns princípios basilares da fé cristã, que se tinham perdido na promíscua relação do poder religioso com o poder político. E, co mo basicamente todo movimento humano de ruptura, a reforma tem muitas motivações e violência de natureza variada. No fim, sim, a reforma tem sido muito positiva social, política, economicamente e nos conferiu uma necessária liberdade de culto.  Mas, nós cristãos protestantes/evangélicos, teremos o que celebrar dia 31?  Restará em nossas memórias algum registro dos legados da reforma? Quando a igreja coloca de lado seu papel de comunidade de fé, que acolhe e cura pessoas e passa a disputar o poder temporal, misturar-se à autoridade institucional da política, ela está automa

O tempero da vida são os afetos

Gosto de cozinhar. Não sou lá uma especialista. Estou longe de fazer as mesas que a minha irmã mais velha faz. Mas gosto de cozinhar. De ficar horas procurando algo na internet uma receita nova para daí fazer (quase sempre) do meu jeito e servir às pessoas que amo. Fazendo uma comidinha para quem amo e quando me dou algo especial é como se fosse um momento de conexão especial. Na verdade é isso. Fazia um bom tempo que eu não me permitia cozinhar com afeto. Talvez a última vez tenha sido o que levei pro reveillon na viinhança. Embora numa correria terrível, caprichei todo o possível. E 2022 chegou como uma tromba d'água assustadora e violenta, levando tudo pela frente, sem respeitar justificativas ou o que mais fosse. E lá se vão quase 45 dias passados e hoje me dei conta que ainda não havia me colocado a fazer do ato cozinhar uma experiência, como gosto.  E olha, não falo de pratos chiques não. Nem sei fazê-los. Como disse, nem sei colocar uma mesa direito. Falo de cuidar dos alime

Os olhos são as janelas do corpo (ou da alma)

Diz a sabedoria: "Os olhos são as janelas do corpo. Se vocês abrirem bem os olhos, com admiração e fé, seu corpo se encherá de luz. Se viverem com olhos cheios de cobiça e desconfiança, seu corpo será um celeiro cheio de grãos mofados. Se fecharem as cortinas dessas janelas, sua vida será uma escuridão." Eu adaptaria para os olhos são as janelas da alma. Por mais óbvio seja, parece que recorrentemente é necessário dizer o quanto nós julgamos as pessoas por aquilo que somos capazes de fazer. E quase sempre isso dista, anos luz, do que elas realmente estão fazendo ou considerando fazer. Então, em um processo de rupturas, por exemplo, se nós somos do tipo agressivo e violento que atua para enxotar as pessoas dos espaços e fazer os mais ardilosos arranjos de modo nos garantirmos em estruturas de micro-poder, é assim que lemos as outras pessoas e começamos a desenvolver pensamentos e medidas conspiratórias em lugares que somente nós encontramos os males imaginados. E e

Narrativas. Vida. Caos. Desesperança.

  Quando eu era pastora repetia com muita frequência, aos membros da igreja, sobre a necessidade de submeterem o que ouviam de mim ao crivo do Evangelho, aprendi isso com o bispo Douglas e com o Paulo, o apóstolo rabugento (e por vezes preconceituoso), mas também zeloso com a missão cristã assumida. Outra coisa que eu repetia era que as pessoas só conseguiriam se desenvolver se exercitassem a capacidade de pensar. Nunca acreditei num Deus que aprecia obediência cega, seres incapazes de fazer perguntas. E cada vez mais falo a Deus que se ele não conseguir se relacionar com as minhas dúvidas, meus questionamentos, as tensões do meus dilemas e mesmo cada um dos incontáveis momentos em que duvido até dele, então ele não é Deus. Será apenas um pequeno fantasma das minhas invencionices mentais, portanto, irreal. E por que isso aqui da gaveta das minhas convicções e incertezas? Assim? A nossa História é basicamente um amontoado de narrativas. Ora elas nos embalam na noite escura e fria. Ora n

Quando os gritos silenciam o diálogo, o que sobra?

Diz o livro sagrado dos cristãos, que todos os dias o Eterno tinha um encontro marcado com a sua criação na viração do dia. E assim, sob o largo emblema do pôr-do-sol, dialogavam. Talvez tenha surgido aí a designação da hora feliz ou o saudável apreço que temos pelo lugar mais sagrado de uma casa: a cozinha, quando à mesa os corações se encontram e um ao outro se entregam às palavras que os conectam. À mesa desfrutamos dos sabores da partilha de refeições temperadas com amor, das bebidas que passam pelo refinamento alquímico do olho no olho honesto que não constrange. Mas à mesa também pode surgir o medo transgredindo a sacralidade da transparência relacional para convencê-la a tomar para si, por vestimenta honrosa, o adorno da culpa.  Foi assim naquela viração do dia, quando as criaturas encerraram o diálogo, se viram nuas e se vestiram de acusação. Aos gritos. Quando leio o relato bíblico, logo ali no terceiro capítulo do Gênesis, sou levada a pensar que o Eterno queria começar uma c

A vida tem dessas coisas

A gente deixa algo de lado por um tempo e depois acha que basta repor a tinta e tudo estará como antes, funcionando adequadamente, produzindo cores, dando forma e ação às palavras postas na tela, aos panoramas mentais, agora transcritos. Então, a gente vai lá. Conecta cabos, instala equipamentos, faz testes de scanner, compra novos cartuchos, faz limpeza superficial, envia impressão teste. Não funciona. Falta a limpeza de bicos, os cabeçotes. Falta calibrar as engrenagens não percebidas à vista superficial e mesmo amadora, ainda que dedicada. Vão-se horas, como o meu processo pessoal, neste momento. Toda uma manhã. Por aqui tudo bem. É apenas um equipamento que estava parado, que me pode ser útil para execução de tarefas, que pode esperar uma manutenção. E o mais desagradável que ocorrerá é o veredito de que a limpeza de cabeçotes sairá mais onerosa que comprar novo equipamento. Decisão de compra não essencial. O real e doloroso mesmo é quando nos atrevem

Escuta é conexão

Sempre fui observadora. Talvez isso me tenha dado boa audição que, tenho percebido nos últimos tempos não tão boa assim. Vezes a perco, depois recupero. E vamos assim, ciclicamente. Na escola eu ficava muito irritada com os colegas e seus recorrentes pedidos para que professoras e professores repetissem palavras e frases dos ditados. Não sei como, mas cedo desenvolvi uma técnica: primeiro escutar com muita atenção, a palavra e mesmo frases, e só depois escrever. Em muitas ocasiões eu perdia uma palavra e só lá na frente a recuperava. Raramente eu pedia repetição. Alguém dirá: todos fazemos assim. Não. Não todos. Aliás, bem poucos. A regra geral é a pessoa esboçar a fala e já querermos terminar o todo da sua expressão. Especialmente se há demanda de relógio, a que atribuímos tempo. Como nos ditados da escola, que normalmente vinham com um "benefício" para quem terminasse primeiro e errasse menos. O resultado efetivo sempre foi que os apressados erravam mais, d

À procura de líderes?

O mundo das receitas é um tanto detestável. Mas, mesmo quando as desprezamos, no fundo, talvez em igual medida, às desejamos. Tem sido meio irritante (a mim, ao menos) o tal novo normal repetido aos quatro cantos, que tem por pano de fundo apenas a reconstrução de todos os parâmetros a que estamos acostumados e que nos devoram e  nos tiraram o sentido de existir. Ainda assim, nós não conseguimos desapegar disso. Gosto de ler publicações de negócios, gestão especialmente. Isso desde quando eu tinha o meu "nano negócio". Era a partir delas que buscava novidades e inspiração, e também visões comportamentais, experiências, jornadas. Quase sempre são publicações repletas de doses vendidas como inspiracionais , mas que no fundo são receituários. Aprendi isso faz tempo. Então, quando me deparo com elas tento extrair valor para o meu mundo e aí, há um tema recorrente e que me interessa: liderança. Temos mergulhado fundo num vácuo terrível de lideranças. Faz tempo. Em dado

Cadê a nossa humanidade?

A vida já não temos coragem de celebrar porque as algazarras à morte nos calam, paralisam, adoecem, sepultam com respiração ofegante mas ainda presente aqui no peito que não suporta tanta idiotização. Ledo engano. A tristeza que nos abate com o deboche ao registro de mais de 10 mil mortos no nosso país m, em decorrência do #COVID19 é daquelas coisas que petrificam, que colocam o coração em pânico, que só trazem as piores perspectivas sobre o que está por vir. Quando perdemos a nossa humanidade? O que nos trouxe a momento de descaracterização humana tão profundo? Será que ainda tem possibilidade de resgate a nós, "humanos"? Ou mergulharemos ainda mais fundo no culto ao horror, na celebração à morte? Um dia em que já se faz triste por não podermos estar em família, lado a lado, celebrando; em que há milhares de lares em luto, ainda temos que lidar com esse fetiche mórbido que parece ser a nova vedete brasileira. E a tragédia maior já nem são as vidas que se f

Apenas palavras. E o sentido?

Nós, evangélicos, chamamos a Bíblia de a Palavra. Então, aqui estou procurando na Palavra alguma palavra que ainda me faça sentido. Há muito novas palavras não me visitam. Permaneço em busca de ressignificar as tantas que há tanto tempo me acompanham, as que me habitam, as que me vestem, as que me escondem, as que me alimentam, as que me tiram o fôlego, aquelas que vem fazem chorar e também aquelas que aquecem minha alma, me dão riso e festa. Há em mim, ou em volta de mim, palavras em silêncio que não entendo, que não consigo decifrar, cujas combinações de letras não me fazem sentido. E elas me rasgam, me sangram. As vezes me provocam.  Há aqui, dentro de mim também, ou a me assediar continuamente, palavras exaltadas, de vozes alteradas, gritos muitas vezes vazios. Noutras são anseios profundos de existir. As palavras são luzes na minha jornada. Mas preciso confessar que também, às vezes, confundem meu caminho e escurecem meus dias porque pesam. Um dia li o Cristo dizendo q

Si.lêncio

Houve um tempo de silêncio significativo dos motores, dos passos na rua, das vozes que insistem em gritar aleatoriamente sem compromisso de algo dizer. E aqui dentro éramos convidados a um olhar interior com menos distração, ao exercício de perceber ao redor, à busca de alguns detalhes ou à simples entrega a pequenos momentos de nada. Enquanto se assevera a nossa crise e aumentam as pilhas dos nossos mortos e o silêncio nos deveria comunicar transformações na lógica de existirmos social e economicamente e nas ações relacionais o que é há rompimento. Não da lógica a que nos acostumamos. Mas do silêncio que deveria estar sendo uma chave mental neste momento. Lá fora os motores voltaram a uivar assustadoramente. E, como se dia normal fosse, os passos acelerados e as vozes nas ruas dizem que a reflexão deu rapidamente lugar à potência do tangedouro do político chefe do nosso país, que insiste na política da morte como cultura a sacramentar no Brasil. O silêncio interior c

O que virá depois?

Talvez a maioria de nós esteja passando por altos e baixos emocionais. Ainda que eu esteja sob um teto, tenha minha casa abastecida e possua meu trabalho e salários assegurados - até o momento -, e cuja ameaça está vinculada à arrecadação do Estado e sua afetação - que sei, chegará, em algum momento, eu estou. Não tem como não está. Não é? Então, fico aqui pensando sobre que legado o que estamos vivendo nos deixará. O que virá no dia depois do amanhã, este incerto desejado? - A sanha competitiva ainda será nossa fiel companheira, outra vez? - As relações de trabalho baseadas na exploração e lucro a qualquer custo ainda nos guiarão as escolhas? - Que compreensão de valor ao trabalho - Estado, empresários e empregados - teremos? - Que valores revisitaremos com o compromisso de tomá-los por base de uma nova dinâmica de vida? Revisitaremos? - A necessidade de estarmos juntos, tão exposta em nossas palavras hoje, é fruto de um despertar de consciência coletiva e vida devotada

SEM PARTILHA DO PÃO NÃO HÁ RESSURREIÇÃO

Os evangelhos trazem uma história, pós crucificação e ressurreição, cheia de significado. Os discípulos no caminho de Emaús. A cidade distava de Jerusalém cerca de 10 km. Um estranho se aproxima e longa conversa se dá pelo caminho. A grande surpresa: acaso você é o único que não sabe dos acontecimentos dos últimos dias? Era eloquente, aquele estranho. E discorria com muita graça e sabedoria sobre as profecias.  Continuava, todavia, um estranho de boa conversa. Chegam ao destino e, sendo noite, os discípulos o convidam para entrar e participar da refeição. À mesa, o estranho de boa conversa ora e, agradecendo reparte o pão. Um milagre acontece. Os olhos de todos se abrem. Os corações aceleram. Eles o reconhecem. É O CRISTO. ELE VIVE. Não há mensagem mais poderosa que a partilha. É a partilha que semeia em nós a esperança. É a partilha que nos renova sonhos e vida. É a partilha que nos faz humanos. É a partilha que nos resgata dos nossos mais terríveis medos. É a partilha que

[v.2020 - APENAS AMEM]

Ele estava muito cansado, física e emocionalmente. Os últimos dias, especialmente desde a sua chegada aos arredores de Jerusalém, não estavam nada fáceis.  Não bastasse a dor de ver o sofrimento do povo, a exploração da fé de todos ali, a inabilidade dos discípulos em lidar com a miséria e a violência, ainda lhe pesavam as próprias dores - da responsabilidade,  da missão, do que estava por vir, da solidão. E  como doía a solidão. Então ele resolveu abraçá-la, já que nada poderia fazer contra ela. E procurou um jardim, que embora sombrio aquela noite, denso e absolutamente pesado - talvez por antever o que logo aconteceria ali, era um jardim. Ele tremia e não era de frio. Talvez nem frio cobrisse aquelas regiões por aqueles dias. Ele estava gelado e sozinho. Ainda que três dos que o acompanhavam fazia três anos, estivessem por ali,  mas distantes, essa era verdade, Ele estava sozinho. As trevas dominaram violentamente aquela noite enquanto Ele gemia. Sozinho.

O toque que cura

A noite foi ruim. Muito quebrada e cheia de medos. Esses invisíveis tão reais que nos habitam e às vezes nos querem, se deixarmos, adoecer. Tentei meditação. Tentei criar mundos imaginários. Nada funcionou, senão o cansaço a me apagar, com pausas e reticências madrugais.  Resolvi começar o dia com novos exercícios. Não abri notícias, de nenhuma natureza. O banho foi mais demorado, mais atencioso ao movimento das águas que me percorriam e o sentido de todas elas em mim - ao tempo em que tentava uma tal desconexão com o lá fora que, sabia, me gritava a um frenesi desnecessário e não cabido. Frente ao espelho percebi que precisava era ficar frente a mim mesma, em carne, pele, sentimentos, pensamentos - meus porquês e (des) razões. Falaram-me ao pé do ouvido, sutilmente, algumas questões. Foram tão amistosas que não pude silenciá-las. Por que estamos em constante batalha mental? Não poderíamos simplesmente desenvolver uma parceria saudável com a nossa própria mente? Por q