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Somos sempre mais do mesmo (?)

Somos mais do mesmo sempre. E, às vezes, é desanimador.

Começamos coisas travestidas de nova mentalidade, de avanço no pensamento e modo de ver e organizar o mundo. De repente, damos no mais do mesmo.

Os velhos muros entre homens e mulheres, definindo na Igreja. Tipificação de "missão de homem vs missão de mulher", no clássico "cabeça baixa, silêncio e "submissão", continuam sendo erigidos.

As velhas cercas de arame farpado que mostram à juventude um "novo mundo" - "livre e interativo" - , ao tempo em que a impede de ir além de um metro quadrado de questionamento, sob o risco de sangrar até morrer porque a liberdade vai apenas até o limite da obediência tácita da vírgula que entorta o texto, não a permitindo ser posta em outros pontos da escrita para fazer sentido ao que se lê, e significado ao que se deve viver. Sim, as cercas estão aí, brilhantes no papel de delimitar claramente o "novo mundo" ao mundo velho.

A velha escuridão, senhora na qual se escondem os monstros que devoram crianças teimosas está pujante, avança a passos largos no adquirir coisas pra entreter, na dosagem cada vez mais pesada do tarja preta pra domesticar, no ocupar o tempo de se sujar para sair na frente na competição que logo, na vida adulta virá e, a infância continua sob o mesmo velho olhar de silenciar e dominar. 

Inventivos. Damos passos acelerados na construção de magnetizadoras soluções tecnológicas.

Inconsequentes. Involutivos. De joelhos nos colocamos para redesenhar o retrocesso, modus operandi da existência.

Na verdade, até parece que é simples e se trata, para começar, que o que está posto de nós, somente não ficará no mais do mesmo de sempre, desalentador, se considerarmos que é uma questão, cujo primeiro esforço é admissão de que não é possível mais existir do mesmo velho modo desrespeitoso, maquiavélico, manietador das mulheres, da juventude, da infância; pior ainda, fazendo isso com a maquiagem de novos valores para um novo tempo. Admitir mesmo, ainda que chorando pela dor da decepção com o que somos, farsantes, mas admitir. É o que precisamos.

A prática das fórmulas novas dos velhos remédios que não curam, só matam, precisa ser admitida, investigada - detidamente - e denunciada na igreja.

A Igreja está de vestes sujas, e não é só dos pecados íntimos dos indivíduos que a fazem. Sobretudo, em razão do sangue de mulheres, jovens e crianças que, sob o manto de uma cristandade que nunca foi proposta pelo Cristo, sacrifica um ambiente saudável onde todos deveriam voz, enquadra o pensamento do jovem para caber numa caixinha de fósforo e domestica a criança a não se perceber gente, desde pequenina, dando a ela o sentido de um produto, portanto, que pode receber livremente marcas e, dane-se o que aquilo significará no futuro, se houver.

Prateleiras e prateleiras estão aí, cheias, e a cada novo dia mais produtos são produzidos nos laboratórios de mentes brilhantes que até intencionam uma revolução, mas desprezam, talvez sem querer, que a grande revolução é: no grande mistério da diversidade, nos exercitarmos a sermos todos um, sem anulação do diverso, sem processos da lobotomia religiosa a que nos entregamos tão facilmente.

A novidade prometida pelo EVANGELHO, as boas novas, é a transformação de mente, não maquiagem de preconceitos. E a transformação de mente é um processo continuado de provocação a não nos limitarmos ao conforto do não confronto.

A bem da verdade?
Estamos bem confortáveis, bem aquecidos nas novas roupagens, bem apresentáveis sob sombras e máscaras e, tocando em frente.

"E enquanto isso, na enfermaria, todos os doentes estão cantando sucessos populares."

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