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“Reduzir a Maioridade Penal é Retroceder no Processo de Efetivação de Direitos”

<br>Fonte: Google Imagens

Em meio a tantas ofensivas conservadoras no que diz respeito aos direitos das minorias, das crianças e adolescentes e a discussão no Congresso Nacional sobre uma possível redução da maioridade penal, o Correio da Cidadania conversou com três responsáveis pelo Sefras Cárcere – a coordenadora do projeto, Camila Gibin, a assistente social Aline Dias e o Frei Alex Ferreira – a respeito do trabalho que desenvolvem dentro dos presídios. Na conversa, discutimos questões que permeiam o sistema penal e prisional.
O Sefras – Serviço Franciscano de Solidariedade – existe há 15 anos e desde o final de 2011 tem um grupo denominado Sefras Cárcere dentro dos presídios e das unidades da Fundação Casa. Trata-se de uma iniciativa socioeducativa que tem como foco discutir questões da sociedade e temas da atualidade de maneira crítica com os internos.
O objetivo principal é criar espaços de convívio com a população presa e desenvolver reflexões e pensamento crítico a respeito dos temas propostos. Além disso, tenta-se possibilitar que a pessoa em situação de cárcere pense a respeito do delito que cometeu de forma mais ampla, levando em consideração seu próprio contexto social e cultural.
Confira a entrevista abaixo:
Correio da Cidadania: Como é o trabalho do Sefras com a população em situação de cárcere e quais as principais diferenças, tanto na questão de gênero quanto na questão etária dentro do sistema prisional?
Aline Dias: Atualmente, estamos em algumas unidades da fundação Casa e unidades com mulheres. Os temas perpassam os espaços. Trabalhamos a questão de gênero com ambos, meninos e meninas, só que de forma diferente. Essas pessoas também são atingidas, de formas diferentes, por tais temáticas. Há uma diferença se a pessoa é adolescente ou adulta, se homem ou mulher. Tentamos fazer uma análise da realidade que a pessoa vivencia e propor atividades direcionadas.
Creio que essa é a diferença. Além da ação que fazemos com as pessoas encarceradas, o Sefras Cárcere também acompanha ações junto com os familiares e propõe a discussão do que está se vivenciando, porque o processo de encarceramento afeta quem está na prisão e outras pessoas ao redor, principalmente os familiares. Trazer a discussão para fora do cárcere também é muito importante.
Correio da Cidadania: Podemos dizer que os familiares também estão em situação de cárcere?
Aline Dias: Eles são criminalizados pela forma como o processo ocorre, pela ausência de informações durante todo o processo, tanto com um adolescente quanto com um adulto, pela forma com que o familiar é tratado nos ambientes prisionais, pela revista que é feita de forma vexatória e por uma série de coisas que acontecem e mudam o cotidiano, a rotina, do familiar de uma pessoa encarcerada. Também há o próprio preconceito no ambiente de trabalho, na própria comunidade onde vive. Existe uma série de fatores para os familiares, que acaba contribuindo para um processo de criminalização deles também.
Frei Alex: Outra diferença que existe no sistema prisional é o fato de ser feito para homens. Todo o sistema é voltado para os homens em uma perspectiva masculina. Isso acaba atingindo as mulheres de uma maneira muito mais violenta e agressiva, porque, tanto na fundação Casa quanto no sistema prisional feminino, não são atendidas as necessidades básicas das mulheres. Assim, com frequência, vemos casos em que faltam absorventes, elas têm de improvisar para suprir algumas necessidades básicas... Enfim, é um tipo de violência que ocorre pelo fato de serem mulheres.
Correio da Cidadania: E que outros exemplos de diferença de tratamento entre homens e mulheres vocês enxergam?
Camila Gibin: O direito e o sistema penal são formulados a partir da visão masculina. Há uma característica de construção pelos homens e carrega essa coisa machista. Tanto as leis como o poder judiciário são assim, simbolizado nas figuras do juiz, do promotor e até do policial, que é o primeiro a abordar as pessoas.
Todo o sistema penal é demarcado pela questão masculina e, quando a mulher é capturada por esse sistema, sofre, não só pelo fato de ter cometido um suposto crime, mas pelo fato de romper com o papel social pré-definido de mulher ideal. O que está colocado é que a mulher tem de assumir uma postura de comportamento docilizada. A sociedade diz que a mulher tem de ser um sujeito dócil, estar dentro do ambiente familiar, do espaço privado do lar; ela tem de assumir esse espaço como o seu lugar ideal – claro que não é bem assim, porque as mulheres também precisam trabalhar e fazer uma série de coisas, mas existe uma certa expectativa social quanto a isso. Quando ela rompe isso, deixa de ser a mulher submissa e passa a ter um comportamento ativo para a sociedade. Com a prática de um crime, mais ainda, pois ela rompe com a dimensão formal, a legal e também com uma dimensão informal: o patriarcado.
Assim, ela assume duas penas nesse sistema: uma pelo crime que cometeu e outra mais social, por romper com os valores esperados em uma mulher. Conheço, por exemplo, casos de mulheres que acabam ficando mais tempo presas do que homens que cometeram o mesmo tipo de delito; a mulher fica presa mais tempo com o processo parado, enquanto, para o homem, o processo caminha mais rápido e, muitas vezes, o alvará de soltura chega mais rápido também.
Frei Alex: E há um abandono inclusive por parte dos companheiros, porque, quando um homem é preso, geralmente a companheira continua visitando-o, ele recebe visitas frequentes. Quando a mulher vai presa, com certa frequência é abandonada pelos seus companheiros.

Fonte: Correio Cidadania

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