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Olhando Vesgo

Já faz bastante tempo "não consigo tempo" para escrever por aqui. Hoje, no entanto, trago uma publicação especial e tomada de empréstimo da querida Jane Maria Vilas Bôas. Garanto: vale a leitura e depois dela refletir um pouco sobre a temática e o rumo que temos dado ao nosso Brasil.
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OLHANDO VESGO
Jane Maria Vilas Bôas

A cada descoberta de mais bilhões de dinheiro público surrupiado de órgãos governamentais – portanto tesouro de todos os brasileiros – mais a população fica indignada e perplexa com o tamanho da corrupção.
Alguns dos envolvidos além de nos roubar, matam a esperança de que a política seja um lugar para produzirmos coisas boas para todos.
São dois crimes praticados no mesmo ato, apropriação do que é público e a porta fechada para o único caminho coletivo que fez a humanidade avançar rumo a regras de convivência democráticas, com justiça, com possibilidade de vida digna para todos. E o crime é tanto maior quanto se vê que essa estrada ainda não chegou ao fim, o processo não se completou, o que foi plantado ainda não deu todos os frutos.

Matar a esperança coletiva, retirar a confiança em instituições que foram construídas para funcionar como fonte de virtude e bem, é traição das mais graves quando o agente público ganhou seu espaço conquistando a confiança popular com promessas de seriedade e retidão.
Desacreditar dos métodos que a boa política tem é danoso. Mais ainda quando temos tantos problemas sociais e dores espalhadas pela população para enfrentar como povo, como país. É muito enganoso começar a perguntar sobre o que fazer agora quando a obra começada, no rumo bom da democratização da democracia, foi posta em suspeita por atitudes egoístas, sem ética, sem respeito pelas pessoas ou pela história.
E mal se supera o susto dessa descoberta inicial da traição da confiança coletiva e já se encontra outro susto, outra perplexidade. O Congresso apressa a votação da maioridade penal para garantir o enfrentamento da impunidade.
Fala-se de bilhões sumidos, evaporados, reencontrados em paraísos fiscais na Europa. Fala-se nas páginas policiais de gente importante, com cargos importantes, membros de forças políticas importantes. Fala-se de ramificações assustadoras de conluios atravessando legislativo, executivo, judiciário. Fala-se de fortunas amealhadas com informações e posições privilegiadas. E, em meio a todas essas notícias, a medida que ganha apoio e popularidade para responder ao clima de impunidade, é aumentar a maioridade penal.
Esses garotos pobres, na maioria negros, de famílias destroçadas pela falta de tudo - da comida à educação – cooptados pelo tráfico com promessa de futuro imediato, embora curto, viram a personificação do que deve ser combatido, encarcerado, tirado da vista da população honesta. Agora são eles que criam todos os problemas de segurança da sociedade. São eles que causam todo o desconforto nas metrópoles. São eles o “outro”, estranho e ameaçador a gerar grades em janelas, cercas em jardins, medos por todo lado.
O mais espantoso é que a torcida pelo rigor, pelo encarceramento, pela punição desmedida – porque não é só jurídica, ser preso no Brasil é ser jogado no inferno, como o próprio atual Ministro da Justiça afirmou, em mídia nacional – é voltada para os impotentes, os desesperados, destruídos psicologicamente, que causam os danos localizados, ainda que terríveis para quem os sofre.
Flagrados em grandes tramoias corruptas, alguns líderes políticos engendram um espetáculo que corresponde a jogar carne aos leões no picadeiro e fazem a plateia vibrar, caindo na armadilha.
As Comissões do Congresso votam às pressas a maioridade penal apontando o dedo para os que já são vítimas da falta de oportunidades. E todos olham nessa direção. Atiçados pelo desejo de segurança, paz, tranquilidade, todos muito legítimos, se apegam a essa orientação e correm enganados, mas felizes, no rumo daquilo que parece solução e torcem para que mais e mais adolescentes perdidos sejam presos. Mais que isso, que caiam sobre eles toda a dor, frustração, sofrimento de quem vive com medo e luta muito para viver.
Enquanto isso, os que sempre usufruíram de benesses, grandes negócios com dinheiro público, articulações que eternizam seus poderes locais, ganham tempo para manter seus impérios, suas vidas confortáveis, seus passeios pelo Velho Mundo e pela América rica.
Não seria o caso de lutar por reforma política para que a democracia se aprofunde e avance? Não seria o caso de exigir que as políticas sociais que deram certo e tem tecnologia testada e aprovada virem política de Estado e deixem de ser de governo servindo de chantagem em eleições? Não seria o caso de ter leis que sejam cumpridas? Instituições públicas saneadas? Não seria uma grande bandeira lutarmos até que se consiga uma Educação pública com qualidade à altura das oportunidades ambientais de nosso país? Não seria uma boa causa lutar por uma Saúde Pública que se baseie na prevenção e não na lida burocrática e desumana com a doença?
Meu país está escolhendo encarcerar meninos. O que aconteceu como o nosso olhar?
Brasília, março de 2015

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