Por quase sete anos tive um chefe que não admitia erros, e até que aprendi a lidar com aquele "terrorismo", claro, acho que estava aí a razão para erros bobos, que muito facilmente poderiam ser evitados. Não o condeno, pois é fato que vivemos uma cultura de culto aos super-homens e supermulheres dos quais se exige a perfeição e a quem não se pode conferir nenhum ato falho, nenhum deslize, senão, diante de tão absurdos e incompatíveis atos à condição humana, resta a desmoralização completa e irreversível.
Mas, se é que tenho autoridade para tanto, condeno a nossa sociedade por nos condenar a isso e faço mais, grito: aos protestos, camaradas. Sim, façamos passeatas, criemos #hastags, abramos fóruns e brademos alto "PELO DIREITO DE ERRAR".
A questão é que de repente, ou nem tão de repente assim, nos deparamos com uma geração perdida, certa de suas fraquezas e mais certa ainda de que os erros contribuem radicalmente para o processo de aperfeiçoamento humano (e das coisas também), e que se vê obrigada à inadmissão dos erros, camuflando-os, portanto; não lidando com eles e, consequentemente, não agregando à sua trajetória o start de aprendizado que os erros provocam. O que é uma pena.
E aí, sempre que discuto sobre essa questão, me vem à memória entrevista de uma brasileira, executiva da Microsoft, que falava sobre empreendedorismo, numa espécie de comparação acerca do cenário para se empreender no Brasil e nos Estados Unidos. Em linhas gerais, ela dizia que lá, os norte-americanos "quebram", em média, sete vezes até que um negócio dê certo e, 'tudo bem'. Quebrei? Ok, vamos aos reparos, à nova tentativa. Não é isso? O que pode ser? Quais os outros caminhos? Quais as outras possibilidades? Em que outro ramo posso tentar empreender? Enquanto isso, por aqui, na terra brasilis, primeiro somos educados com a ideia de que ser bem sucedido é ocupar um cargo público; segundo, ser funcionário de uma grande e renomada empresa. E partir para empreender? Bem, eis aí um risco demasiado; loucura, até; aquela escolha que já deixa os pais de olhos arregalados e preparados para ter um filho (a) a sustentar pelo resto da vida. O fracassado. Ou seja, é aquela pressão de desestímulo e tentativas após tentativas de provar que essa vida é complicada demais para ser feliz.
Claro, estou trazendo um quadro que graças aos bons ventos do sentimento libertário e inovador da juventude do século 21, já está mudando (mas isso ainda é um processo de alguns privilegiados e do outro lado está a turma do empreender para sobreviver). O resumo dessa ópera, é que se exige de nós dar certo na primeira tentativa de empreender, e eis aí, uma tarefa que se torna ainda mais árdua sob essa pressão.
Eu já quebrei (ou como costumo dizer, fui quebrada. Enfim, quebrei) uma vez, e estou há quase três anos na tentativa de tocar duas ações empreendedoras - relacionadas mas - diferentes, e sei muito bem o quanto me pesa ter que dar cedo, não bastasse por minhas próprias necessidades, também, por esse ciclo de cultura que temos.
E se fôssemos mais livres para errar?
Não estou falando de uma vida irresponsável, embora reconheça que há somente uma linha bem tênue a separar esses dois mundos. Digo de permitirmos aos nossos jovens, especialmente, a grandeza de experimentar as possibilidades de construção profissional sem a ensandecida pressão de ter que escolher certo da primeira vez.
Sabe o que vejo?
Uma geração com um mundo de possibilidades à frente, mas carregando nos ombros um mundo que não lhes pertence, e que sufoca a descoberta da profissão que pode dar satisfação pessoal e dignidade. Sim, uma utopia possível - acredito, porque o sucesso se mede muito mais pela autorrealização que pela conta bancária, o carro do ano, as viagens a paraísos de consumo, a frequência a restaurantes caros e por aí vai. Não que eu esteja condenando quaisquer dessas coisas, apenas o modo como lidamos com elas.
Então, deixo aqui um convite ao engajamento nessa luta pelo direito de errar, de quebrar a cara, de fazer besteira, de fracassar, de mudar de ideia, de descobrir que não é bem isso que se imaginava, de visitar outros universos profissionais que não os tradicionais ou a carreira dos pais sem se achar um alienígena ou um pária e quem sabe, depois disso, as pessoas se descubram, de modo menos sôfrego, mais humanas e assim, assumam a Terra como responsabilidade suas e o olhar a cada compartimento desse planeta, representado desde o metro quadrado mais perto de si até o país distante, como seu, e que, portanto, a sua energia vital possa se tornar muito melhor aproveitada aplicada à criação de ambientes humanizados e de relacionamentos baseados na admissão de fraquezas e fracassos como naturais e necessários aos que querem viver bem consigo mesmo e com o outro, agora não só o outro mas, o seu próximo. E aí, quem sabe consigamos um mundo mais harmônico, colaborativo e generoso, cuja loucura seja a do direito de errar sem auto-condenação e não a de forjar-se no que não há base estrutural ou desejo para se tornar.
Se só podemos produzir algo de verdadeiro e sustentável quando isso vem da nossa essência, quem sabe, de pessoas mais sadias mentalmente e mais livres espiritualmente, tenhamos ambientes mais sadios e mais livres para criar e viver, compartilhados entre nós, nossos filhos e os demais seres dessa minúscula partícula da existência!
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