Pular para o conteúdo principal

O segredo da vida é a morte

Quase sempre temos aversão a falar, discutir ou sequer pensar sobre a temática morte. Parece-nos, tantas vezes, que a reboque do tema virá uma onda inconsequente de azar e ai, repugnamos o assunto. Mas, na realidade, ao nos privarmos de falar a respeito da morte, privamo-nos também de desenvolver o hábito da avaliação da nossa existência, no contexto de razão de ser para que a vida consiga, assim, fluidez. E perdemos a percepção de que não há vida, sem antes haver morte e por isso, gastamos os nossos dias sem que tenhamos vivido, até que nos suspiros finais, nos damos conta de que a morte anterior teria processado uma vida que agora não poderá ser experimentada.

Um grão, quando lançado à terra, antes morre para somente depois gerar vida.

A vida que nos foi prometida, somente nos foi liberada após a morte do Cristo que a Sua vida por nossa vida entregou e nos chamou a segui-Lo, alertando-nos, entretanto da  necessidade fundamental de nos fazermos morrer para que a vida dEle pudesse, enfim, em nós operar.

Mas, morrer não é fácil. Sim. Costumeiramente, frente a problemas e desafios da nossa carreira terrena nos vemos repetir que 'a vida é difícil'. Viver não é difícil. Difícil é morrer. Fazer-se morrer.

Viver implica em simplesmente deixar correr a fonte que nos é compartilhada após a morte do nosso eu. 

Já morrer! 

Morrer implica em negar-se a si mesmo. 
Morrer implica em abrir mão do curso dos próprios dias em escolhas e vontades.
Morrer implica em abster-se do eu.
Morrer implica em abdicação de querer.
Morrer implica em fazer escravo.
Morrer implica em abnegação por aquele que se julga inimigo.
Morrer implica em andar na contramão em enfrentamentos interiores dos mais dilaceradores.
Morrer implica em obediência.

Mas, ao que morre lhe é entregue o dom da vida e o paradoxo do Espírito se concretiza em paz na guerra, força na fraqueza, alegria no dia de luto, luz raiando de entre as trevas, príncipes erguidos do monturo, abastança entre os necessitados, certeza de chegar ao destino em ambiente de loucura, pois quando morremos em nós, Ele começa a viver e operar a verdadeira vida em nós.

Preocupa-me, portanto,  quando eu me percebo querendo gerar vida sem ter morrido nos meus conceitos e preconceitos e medos e questionamentos e dúvidas.

Preocupa-me, quando eu me percebo lançando veementes argumentos contra sistemas religiosos e estruturas institucionais, sem ter morrido minha natureza pecaminosa que me afastou da construção diária de relacionamentos a partir da minha morte.

Preocupa-me, quando me percebo na insistente exaltação da necessidade de ter a minha  voz ouvida e grito tão alto essa minha condição que não ouço a suave voz do Espírito dizendo-me: 'simplesmente morra, Ádila, morra e então, você viverá'.

Preocupa-me, viver para mim, fazendo-me assim, morta no sentido da vida espiritual que não opera em mim, já que o seu fluir não foi acionado pela vida dEle, pois se a vida é minha, a vida dEle em mim não existirá e os meus dias escorrerão por entre os meus dedos sem que eu tenha  qualquer controle sobre eles, e nada poderei fazer por aquilo que eu dizia ser o de maior valor, pois o seu valor está em morrer em mim para viver a vida dEle, por Ele e para Ele.

E, assim, então, é preciso entender que o segredo da vida é a morte e sem a morte, não há vida.

Até breve,

Ádila Lopes

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Democracia e representatividade: por que a anistia aos partidos políticos é um retrocesso

Tramita a passos largos na Câmara dos Deputados, e só não foi provado hoje (2/maio) porque teve pedido de vistas, a PEC que prevê anistia aos partidos políticos por propaganda abusiva e irregularidades na distribuição do fundo eleitoral para mulheres e negros. E na ânsia pelo perdão do não cumprimento da lei, abraçam-se direita e esquerda, conservadores e progressistas. No Brasil, ainda que mulheres sejam mais que 52% da população, a sub-representação feminina na política institucional é a regra. São apenas 77 deputadas entre os 513 parlamentares (cerca de 15%). E no Senado, as mulheres ocupam apenas 13 das 81 cadeiras, correspondendo a 16% de representação. Levantamentos realizados pela Gênero e Número dão conta que apenas 12,6% das cadeiras nos executivos estaduais são ocupadas por mulheres. E nas assembleias legislativas e distrital esse percentual é de 16,4%. Quando avançamos para o recorte de raça, embora tenhamos percentual de eleitos um pouco mais elevado no nível federal, a ime

Bereshit → Rosh = Cabeça!

Bereshit é a primeira palavra da Bíblia. Moises não escreveu Gênesis - ele não conhecia esta palavra. Ele escreveu Bereshit. Gênesis foi a tradução dada pela septuaginta (tradução grega da Bíblia), de onde vieram os nomes dos livros do chamado Pentateuco. Os 5 livros de Moises são conhecidos em Hebraico como os 5 quintos ,ou seja 1 inteiro. Cada um dos livros sugere uma parte de um todo e Bereshit a primeira delas. O nome dos livros da Bíblia em Hebraico é o nome da primeira palavra, por isso o nome de Gênesis que significa No principio. A raiz da palavra Bereshit é palavra Rosh que significa Cabeça! A primeira palavra da Bíblia - No Cabeca marca o principio de Deus. Para o homem o principio é o coração, para Deus é a cabeça, e Cristo é o cabeça da nova criação, e nós temos a mente de Cristo! A primeira palavra da Bíblia já fala de Cristo, o cabeça! Col.1:17-18 revela que Paulo sabia de tudo isso. Ele é antes de todas as coisas, Nele tudo subsiste, Ele é a cabeça do corp

De longe somos mais interessantes (?)

"A distância iguala tudo".  É quando se está perto que as diferenças e desigualdades se tornam visíveis e passam a incomodar e ai, ou nos empurram para longe outra vez, ou nos movem para  a construção coletiva rumo a um novo caminho. A frase de abertura desse artigo foi capturada de um filme, o documentário "Lixo Extraordinário" e ela é dita por Vik Muniz. Desde que a ouvi, tenho tentado não esquecê-la, mas permitir que o incômodo que ela me provoca, se reproduza num processo de transformação interior frente ao que há dentro dela, segundo o meu ponto de vista. É engraçado que nós sabemos que nos é impossível uma vida plenamente saudável (física, emocional e espiritual) se escolhemos o caminho do isolamento ou como queremos crer, do distanciamento.  À distância vemos uma rosa, não seu espinho;  À distância vemos um rio, não o seu odor; À distância vemos um lixão, não a degradação que o habita; À distância vemos o nosso Congresso Nacional, não o